LIVRO: Um defeito de cor

Um Defeito de Cor: Resenha do Livro de Ana Maria Gonçalves

Olá, amantes de livros e entusiastas da literatura! Hoje, tenho o prazer de trazer a vocês a resenha de um romance poderoso e instigante que me deixou sem palavras. “Um defeito de cor”, de Ana Maria Gonçalves, é uma obra-prima que se aprofunda nos complexos temas de identidade, raça e sociedade.

Essa saga fascinante acompanha a jornada de uma jovem mestiça no Brasil do século XVIII, lutando contra sua herança e as duras realidades da escravidão. 

Enquanto lia as páginas desse romance magnificamente elaborado, me vi cativada pela rica narrativa e pela profunda percepção que ele proporciona sobre as lutas de indivíduos marginalizados em uma sociedade assolada pelo racismo.

Junte-se a mim enquanto mergulho no mundo de “Um Defeito de Cor” e exploro a narrativa hipnotizante que, sem dúvida, deixará um impacto duradouro em sua alma.

Sinopse Sobre o livro defeito de Cor

Fascinante história de uma africana idosa, cega e à beira da morte, que viaja da África para o Brasil em busca do filho perdido há décadas. Ao longo da travessia, Kehinde vai contando sua vida, marcada por mortes, estupros, violência e escravidão, uma narrativa essencial para entender o final do livro. Inserido em um contexto histórico importante na formação do povo brasileiro e narrado de uma maneira original e pungente, na qual os fatos históricos estão imersos no cotidiano e na vida dos personagens. Um Defeito de Cor, de Ana Maria Gonçalves, é um belo romance histórico, de leitura voraz, que prende a atenção do leitor da primeira à última página. Uma saga brasileira que poderia ser comparada ao clássico norte-americano sobre a escravidão, Raízes.

Resenha Defeito de cor

LIVRO: Um defeito de cor

Há receios que precisamos admitir antes que sejamos considerados destemidos. Livros volumosos, com mais de 500/600 páginas, tendem a assustar a maioria das pessoas.

Partindo desse pressuposto, acreditamos que livros mais compactos, os chamados “mais fininhos”, serão mais “rápidos”, uma leitura mais “fácil”.

Um livro com mais de 600 páginas intimida, exige um esforço maior – e se não for bom?

E hoje, com tudo tão rápido, tão a. zap No final das contas, acabamos esperando que a leitura seja rápida: abriu, leu, acabou, fechou.

Próximo capítulo de No entanto, a leitura exige mais tempo e dedicação. Acredito que deixei para trás esse receio ao descobrir “Um defeito de cor”, de Ana Maria Gonçalves.

Admito que, quando peguei o livro E fui surpreendido. Este livro superou as minhas expectativas e as páginas passaram voando.

O livro já nos chama a atenção pela forma como a autora conseguiu o material para o romance. Ao mudar-se para Ilha de Itaparica, vinda de São Paulo, Ana Maria afirma ter encontrado acidentalmente na casa de uma moradora do lugar uma pilha de papéis antigos sobre os quais uma criança desenhava.

No verso de cada folha era possível ver uma escrita feita com caneta tinteiro.

Ao perceber a importância histórica daqueles papéis, por reconhecer vários nomes, fatos e datas de eventos importantes do Brasil do século XIX, ela negociou com a família e conseguiu esses documentos, um momento crucial na vida de Kehinde descrito em Assim começa a jornada da escrita. Tudo isso, de acordo com a autora, é resultado da serendipidade.

E para entender o que é essa tal de Serendipidade, é necessário ler  serendipity Aqui está a definição de serendipidade pela própria autora: “Serendipidade é quando encontramos algo inesperado enquanto procuramos por outra coisa, mas já estávamos mentalmente preparados para isso”.

O título “Um defeito de cor” faz referência ao decreto colonial que excluía não-brancos de certas oportunidades na sociedade brasileira, como empregos públicos e outras profissões. No entanto, a história do negro no Brasil é o foco dessa narrativa, contada pela voz memorialística de Kehinde.

Ela nos relata sua infância em Savalu, reino do Daomé (atual Benin), sua vinda para o Brasil como escrava na Bahia e no Rio de Janeiro, seu retorno à África e, por fim, sua última volta ao Brasil no final da vida.

O livro não se concentra apenas na cor da pele ou na origem étnica, mas sim na construção de um discurso dos afrodescendentes no país e nas marcas deixadas por essa experiência. Ele apresenta um passado sob um ponto de vista não eurocêntrico.

Kehinde não é a heroína deste romance por ser negra e escrava.

Kehinde é uma criança que sofre violências tanto na África como no Brasil, quando escrava participa de revoltas contra a ordem estabelecida em Salvador, torna-se fugitiva, mulher, amante, mãe, é abandonada e se transforma em uma empreendedora com visão comercial adquirida em sua condição de escrava, e através da venda de biscoitos caseiros consegue comprar sua liberdade.

Um breve resumo da história: Após presenciar o assassinato de seu irmão e o estupro de sua mãe pelos guerreiros do Rei Adandozan, Kehinde, sua avó e sua irmã gêmea Taiwo viajam para Uidá. Depois de um curto período de felicidade, as meninas são capturadas e levadas em um navio negreiro.

A avó, desesperada, decide acompanhá-las. No entanto, por conta das péssimas condições de higiene nos navios que atravessavam o Atlântico em direção ao Brasil, sua irmã gêmea e avó não conseguem completar a viagem.

Kehinde chegou sozinha na Bahia e foi levada para a ilha de Itaparica para ser escrava de companhia da Sinhazinha. Ao chegar ao Brasil, a interação de Kehinde com a população diversificada permitiu o surgimento de uma cultura afro-brasileira própria, marcando o início de sua jornada no país após ter retornado.

Na fazenda, ela passou grande parte de sua infância e adolescência, sendo abusada sexualmente pelo senhor e tendo seu primeiro filho, Banjokô.

Ela trabalhou como escrava de ganho e conseguiu comprar sua liberdade, casando-se com Alberto, um comerciante português, e tendo um filho chamado Omotunde Adeleke Danbiran.

Inspirada nas tradições de sua família, Kehinde dá nomes africanos aos seus filhos, uma passagem marcante na vida de Kehinde narrada em Os nomes são escolhidos em cerimônias secretas, nos porões da casa grande. As cerimônias de nomeação, conduzidas por um babalawo, afirmam que uma pessoa não possui um nome, ela é o nome que carrega.

Seu segundo filho, fruto de uma relação estável, foi chamado de Omotunde Adeleke Danbiran. Omotunde significa “a criança voltou”, Adeleke significa “a criança será mais poderosa que os inimigos” e Danbiran é uma homenagem à avó de Kehinde.

O pai deu o nome branco de Luiz, e aqui, Ana Maria Gonçalves sugere que Kehinde e Luisa Mahin poderiam ser a mesma mulher – mãe de Luiz Gama, conhecido jornalista e poeta que lutou contra a escravidão e a favor da liberdade.

Luisa Mahin foi uma líder feminista que participou da Revolta dos Maleses, que inspirou a autora a recontar ficcionalmente a história de Kehinde e, por meio dela, as condições de vida dos escravos na Bahia do século XIX.

O livro destaca que a protagonista teve uma vida cheia de viagens: de Savalu, Uidá, Bahia, Rio de Janeiro, São Paulo, Campinas, por quase todo o Brasil, até sua volta à África. Essas mudanças ao longo do tempo transformaram Kehinde.

Neste romance, a nova identidade de Kehinde é revelada quando ela retorna a Uidá e passa a ser chamada de Sinhá Luíza, tanto pelos que retornaram quanto pelos que nunca saíram de lá. A mudança pode ser explicada pelo fato de que ao voltar para suas raízes, Kehinde perdeu sua identidade original.

Quando chegou ao Brasil, ela manteve suas origens africanas, mas posteriormente conscientemente assumiu sua nova identidade como Sinhá Luíza.

Na África, surgem novas oportunidades comerciais que envolvem a negociação de armas, pólvora e óleo de dendê, tanto para os reis africanos quanto para os brasileiros de Salvador. Mesmo não mostrando escrúpulos ao vender armas que seriam utilizadas no tráfico de escravos, em busca de lucro e segurança pessoal.

Kehine reflete sobre essa situação, não concorda, mas reconhece que comércio é comércio.

A jornada de Kehinde não acaba. Outras histórias de amor, perdas e afetos continuam até a última página, mas vou parar por aqui antes de me alongar e contar todo o livro.

Uma das grandes qualidades de “Um defeito de cor” é que não se trata de um livro sobre ser uma vítima, mas sim de uma biografia fictícia que constrói um discurso que nos mostra as marcas das experiências históricas e cotidianas dos afrodescendentes do país.

É um livro que nos leva a descobrir parte de nossa história, costumes e mudanças sociais através de uma personagem que não se encaixa no estereótipo do herói, mas que imprime sua personalidade em cada direção, em cada oportunidade aceita. E cada página lida vale a pena.

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